Ricardo Rocha…
e o destino da Guitarra Portuguesa.
“Voluptuária” e, depois, “Luminismo” são os discos de originais de Ricardo Rocha, um dos mais conceituados artistas de guitarra portuguesa. Tal como nas suas capas, de ambiente sombrio, também a sua residência mostra-nos esse lado mais escuro. É com pouca luz que a conversa decorre.
O diálogo começa com os primeiros contactos que teve com a guitarra portuguesa. “Comecei a tocar com oito anos. O primeiro contacto físico foi aos três. Nunca tive a percepção que era isto que tinha de fazer. Simplesmente, acontece um fascínio muito grande pelo instrumento, e isso não fácil de explicar”, conta Ricardo Rocha, enquanto acende um cigarro.
Da guitarra lusitana ao fado, a ponte é fácil. Uma relação amor-ódio, que tem, segundo o artista, pontos positivos e negativos. “Dissociar a guitarra do fado pode ser um problema para a primeira. Se quisermos integrá-la num outro registo musical, teremos algumas dificuldades. É impossível separar duas coisas que estão juntas há, talvez, cem anos”, explica.
Quanto ao papel que o fado possui na sociedade portuguesa, Rocha só vê vantagens. “Desde a morte da Amália que o fado tem sido utilizado como um estandarte da música portuguesa, um cartão-de-visita cultural. Mais importante ainda, é reparar que está, também, a ter sucesso no estrangeiro. Num país tão pequeno como o nosso, é de louvar o renascimento deste género e o aparecimento de vários bons artistas, nomeadamente do sexo feminino”.
Apesar de, segundo Ricardo, “em Portugal não haver tradição de concertos de um artista de guitarra a solo”, existem cada vez mais pessoas a aprender a tocar. “Há dois, três anos que a guitarra portuguesa começou a ser tocada em todas as conservatórias do país. Isso torna o instrumento conhecido e desperta a curiosidade em aprender a tocar”.
Ainda que destaque o crescente interesse dos mais jovens, Rocha distancia-se de uma carreira a solo. Para o guitarrista, “não existe essa tradição e, por isso, não vale a pena lutar por algo que não existe”. “As pessoas, em Portugal, não vão ver um espectáculo de um artista de guitarra portuguesa a solo. Tem de estar associado, por exemplo, a um cantor de fado”.
Outra das suas grandes paixões é o piano, que, em “Luminismo”, tem direito a um CD inteiro. “Não é nada de muito sério, mas fiz esta experiência porque é um instrumento de que gosto imenso. Digo mais: se tivesse de escolher entre o piano e a guitarra, escolheria o primeiro. Agora não, obviamente, já que é um instrumento que se começa a tocar muito cedo. A sua inclusão no disco tem a ver com a possibilidade de surgirem ideias e construções que na guitarra não são possíveis”, conta.
Quanto ao seu último álbum de originais, Ricardo mostra-se contente pelo resultado final. “Para ser sincero, nunca estive à espera que saísse, mas ainda bem que veio cá para fora. Reuni duas vertentes: guitarra a solo e piano, também a solo. Na minha perspectiva é um disco interessante. Não há álbuns perfeitos, mas parece-me que tem uma linguagem simpática”.
Voltando ao fado, Ricardo Rocha, realça Carlos do Carmo, artista que acompanha “há bastante tempo” e de grande valor humano. “Como disse antes, guitarra a solo é complicado, mas continuarei no fado, e, aí, será com Carlos do Carmo, um óptimo cantor e uma pessoa de qualidades ímpares. Em princípio continuarei com ele. Existem muitos outros artistas bons, mas nesta indústria, os círculos são bastante fechados. Já não deverei tocar com ninguém desta geração mais recente”, finaliza.
A conversa termina como começou. Pouca luz, ambiente sombrio, tal como o fado, sempre negro e triste, como a guitarra portuguesa. Ricardo apaga o cigarro. Fim de conversa.
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