Hype @ Tejo 2006

Hype sem feeling…

Ainda me lembro da aventura que era ir ao Hype… Sair de Lisboa, apanhar a estrada para o Meco, passar na praia e só depois, já com a pele salgada e o cansaço da praia, enfiar-me num festival cheio de poeira, de gente, de boa música, de muita vontade de dançar e muitas horas à procura do carro para voltar a casa…

Pois, o Hype agora não é nada hype!

Não há praia, não há sal, não há poeira e até o som tem os seus problemas… Para não falar de que o carro está logo ali ao lado estacionado à nossa espera!

Aqui começa, então, a minha suposta aventura de mais um “festival”…

Mal entrei,  fui imediatamente assaltada por não sei quantas promoções, ao ponto de já não querer mais coisas. Tantas ofertas e tão pouco espaço na mala. O fenómeno das marcas no Festival é uma coisa de que já gostei, mas agora não sei se já não me irrita. Tentar chegar à música, enquanto não sei quantas marcas me tentam dar coisas absolutamente inúteis que nunca mais vou usar na vida desvirtua um bocadinho a minha noção de festival, mas enfim…

Reparei que o recinto estava absolutamente vazio, exceptuando as pessoas que se juntavam em frente à única televisão do recinto instalada na roulotte dos hambúrgueres. A pobre da Mary B contava com dois entusiastas, literalmente dois… ou não fosse o futebol para os portugueses mais importante do que qualquer outra coisa no mundo. Mesmo nas pessoas sentadas em frente à roulotte, contavam-se pelos dedos das mãos aquelas que não pertenciam a uma qualquer marca e que estavam a trabalhar numa promoção.

Começa, então, a actuação dos Kudu, ainda em pleno jogo de futebol. Que ultraje… A senhora a fazer barulho e o pessoal a tentar ouvir o árbitro… Apesar de o som estar absolutamente estridente, Sylvia Gordon, no seu estilo punk-electro-erótico lá conseguiu manter algumas (poucas) dezenas de pessoas em frente ao palco, com um estilo sensual e as batidas certeiras do baterista Deantoni Parks. Um palco simples, mas apelativo.

Experimentei, então, ir espreitar o palco Hype e deixem-me que vos diga que Télépathique chegou e venceu… As fusões breakbeat e funk condimentado da favela fizeram dançar o pouco público presente e algumas recriações de clássicos da MPB até arrancaram algumas vozes tímidas à audiência… Não conhecia a banda, mas foi uma agradável surpresa, cheia de mensagem, beat e uma contagiante energia.

E lá fora, a imensidão do vazio continuava…

Os Atmosphere não conseguiram actuar nas perfeitas condições e, portanto, não foi uma demonstração justa do seu imenso potencial, enquanto verdadeiro hip-hop norte-americano, o que transmite uma mensagem e se converte na chamada nova música de intervenção. Slung e Ant ficaram sem nenhum aparelho em palco, sendo que o seu DJ teve que ir operar todos os sons para a cabine de som por trás do público… Algo está mal neste filme.

Seguiram-se no palco principal os britânicos Hot Chip, que sinceramente eram tão fraquinhos que não conseguiram convencer-me a ficar… Preferi apanhar o comboio e parar na Buraka Som Sistema. A festa do kuduro progressivo de Kalaf, Lil’ John, Riot e a MC Petty contagiaram o público com ritmos africanos explosivos, sincopados, repetitivos e irresistíveis. Dançar é a única solução.

Seguiu-se, então, o que muitos esperavam e o verdadeiro motivo para o Terrapleno de Santos não estar absolutamente vazio: Massive Attack. Por muito que digam, concerto com brilho ou sem brilho, os Massive continuam a invadir-me massivamente com os sons do trip-hop e colocar-me numa trip em que levito e me deixo maravilhar por um show de vozes absolutamente impressionante.

A presença da lenda do reggae Horace Andy e da voz quente, cheia de soul, de Deborah Miler são a cereja no topo de um espectáculo visualmente perfeito, com um ecrã gigante formado por inúmeras lâmpadas multicolores, que tornaram Lisboa mais brilhante e mais ritmada. As já habituais mensagens anti-EUA, cheias de força e sentimento, acordavam o público mais distraído para as realidades políticas do mundo actual.

3D e Daddy G não apresentaram, no entanto, um espectáculo ao nível do que eu sei que os Massive Attack conseguem… Ficou a faltar a emoção de outros Festivais, sendo que um concerto de Festival tem sempre as suas limitações, mas recordo uns Massive Attack cheios de soul, sentimento e a provocar uma massiva reacção no público do Sudoeste de há uns anos…

Tenho ainda de referir o fenómeno interessantíssimo dos Festivais junto de uma geração ainda abaixo da minha. Os adolescentes urbanos cada vez saem mais cedo, não pelo prazer da música que nos arrasta a todos há tantos anos, mas pelo fenómeno de ser in ir a Festivais. Bem, no início do concerto de Massive, estavam em palco os inconfundíveis e enigmáticos Daddy G e 3D, sendo que uma rapariga, que deveria ter os seus 14 ou 15 anos, aproxima-se do palco e comenta com a amiga: pensava que já eram os Massive, mas ainda não são eles… Nem as vozes dos próprios as demoveram e elas acabaram por se afastar. Será que elas se arrependeram e voltaram atrás ou já não foram a tempo? Essa parte já não sei, estava demasiado imersa na sonoridade massiva.

Seguiu-se, então, DJ Marlboro no palco Hype. Sons ritmados, quentes das favelas cariocas levaram ao rubro a audiência apesar do som batido, repetitivo e sem nada de novo.

Diplo terminou a noite com uma actuação muito ligada a sonoridades urbanas e com diversas influências musicais, desde o funk carioca ao crunk da Califórnia.

Um Festival que já não é hype não se deveria chamar Hype, por favor dêem-lhe outro nome e reformem o formato, a localização, tudo. Um Festival não passa só por algumas bandas e algumas marcas a auto-promoverem-se, não deixem os Festivais perder a sua mística.



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