“Este Samba no Escuro” | Raquel Ribeiro
Havana dos forasteiros
Natural do Porto, Raquel Ribeiro tem vindo a prestar provas na área da investigação (foi bolseira da Fundación Nuevo Periodismo Iberoamericano e da Universidade de Nottingham) e do jornalismo, como colaboradora pontual do Público. Além disto, sob o pseudónimo Maria David, publicou “Europa” em 2002.
Num elogio ao e-reading publicado numa das plataformas online do referido jornal, sumariza na introdução um princípio e lugar-comum de vários indivíduos que se dedicam à escrita: «Sou uma leitora profissional. Escrevo, estudo, investigo, faço crítica literária, entrevisto escritores. Ler é o meu trabalho.» É deste contexto que parte o labor que originou “Este Samba no Escuro” (2013, Tinta da China), um romance sobre Cuba com vários cubanos pelo meio, numa narrativa suportada pelo saber enciclopédico da autora – que lá viveu. Daí que tal intimismo forasteiro esteja munido de um know-how profissional que vai borrando as linhas que distinguem a ficção da reportagem ou da crónica, assumindo-se, porém, como romance. Garantido fica que o leitor não está perante uma pessoa que fez uma viagem à Coreia do Norte, por exemplo, e que quis escrever um livro sobre isso.
De um lado temos o protagonista masculino, Álvaro, carregando em si o peso da discriminação racial e a severidade do treino militar, que chega a registar em “facturas de electricidade” os seus desabafos pessoanos (Álvaro é músico, portanto só pode ser um tipo sensível); do outro está Lia, “contra-revolucionária” feminista que acaba por revelar vários tiques sexistas, que parece acreditar tanto na “luta” para mudar Cuba que se questiona sobre o porquê de abandonar um barco que se afunda. A uniformidade destas e outras vozes presentes na obra permite que pontualmente se refira o nome do personagem antes da respectiva fala, característica inata do guionismo que os autores literários, pura e simplesmente, não precisam.
O fascínio introspectivo com a sociedade cubana certamente marcou Raquel Ribeiro, fascínio esse que nunca parece ser posto de parte enquanto narradora. Daí que Havana seja mais protagonista de “Este Samba no Escuro” que a panóplia de “pessoas” que povoam o universo hiper-realista da autora. Cuba é exaustivamente descrita sob inúmeras camadas e, quem nela habita, representa o cidadão anónimo que se esconde do olho preguiçoso do turista.
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