“Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”
Dissecção de uma paisagem emocional
Obsessão, ciúme, felicidade, confusão, desejo, excitação e desgosto. Todos eles atributos típicos de uma amizade, de um amor adolescente e sobretudo de uma comédia romântica, onde qualquer um consegue prever o desenlace após cinco minutos de filme.
Quatro anos depois, recorrendo aos mesmos actores, Daniel Ribeiro volta-se para a sua terceira curta-metragem e apresenta-nos a sua primeira longa. A história é exactamente aquela pela qual muitos se deixaram apaixonar, só que desta vez o realizador decide focar-se nos detalhes de cada uma das personagens. Ficamos, desta forma, a conhecer a família do protagonista e os arrufos deste com alguns dos seus colegas. É-nos dado a ver mais sobre o impacto que tudo isto tem na interacção dos três amigos, na construção dessa relação e na descoberta do protagonista.
O filme reflete inúmeros comportamentos e regras de conducta sociais e universais do nosso tempo. Isto enquanto aborda temas como a superproteção parental; o ciúme e inseguranças da adolescência; a provocação e intimidação subjacente a esta faixa etária; a formação de forma gradual da identidade e o despertar da sexualidade, que em situações extremas explode incontrolavelmente. As inquietudes constantes da puberdade são aqui retratadas de forma clara e natural.
Tudo é pura simples e verdadeiro. Tudo graças a um trabalho fotográfico polido, a uma banda sonora que vai de Schubert a David Bowie e a uma narrativa cuidadosa. O realizador brasileiro instala, gradualmente, uma atmosfera resolutamente optimista e despretensiosa.
O trabalho dos jovens actores é sincero e ajuda-nos a navegar por uma história que aumenta a dissecção subjacente a uma complicada paisagem emocional. De certa maneira, grande parte do charme despretensioso e autenticidade do filme provém dos três amigos. Guilherme Lobo desenvolve um retrato expressivo por entre uma ampla gama de sentimentos e um desejo manifestado por uma normalidade. Fabio Audi e Tess Amorim extrapolam o mundo do protagonista, originando um ambiente platónico. Os seus personagens são os catalisadores para a complexidade.
Hoje Eu Quero Voltar Sozinho poderia ser um mero exercício cinematográfico fresco, leve e original. Poderia ser até mesmo belo, tal como a curta-metragem que lhe deu origem. No entanto, o filme do realizador brasileiro roça a ténue linha do cliché e do aborrecimento em vários momentos. Ainda assim, a obra consegue tornar-se intimista e realista, à medida que as personagens, aos poucos, se despem sem medo das suas próprias emoções.
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