Joana Mora na Filosofia #1 – Ilustração de Ruaz

[Joana] Mora na Filosofia #1

Um bípede sem penas? És um Homem ou uma galinha depenada?

Um dos filósofos mais conhecidos aqui da aldeia Filosofia é o Diógenes de Sínope:  polémico, atrevido, já para não falar do facto de viver  num barril. A sua escola filosófica, dos cínicos, é conhecida pelas reuniões no Cinosorges, um ginásio onde, para além de se fazer exercícios físico, se conversa bastante.

Há muitas histórias que se contam sobre o atrevimento deste homem, filho de um banqueiro. A dada altura, num dos cafés filosóficos aqui da aldeia, discutia-se o que era o Homem. Platão avançou com a ideia de que o Homem seria um bípede sem penas. Diógenes só descansou quando lhe apareceu à frente com uma galinha depenada. Platão ficou sem resposta e comentou comigo « Joana, o Diógenes é um Sócrates louco, sabes?».  E rimos os dois, muito. «Tens razão, Platão. Diógenes é profundamente atrevido e é o seu atrevimento que nos faz questionar as convenções, as coisas em que acreditamos, os hábitos e costumes de todos os dias. E as nosssas definições. Diz-me lá se não foste para casa rever a definição de Homem, depois de te ser oferecida uma galinha sem penas!», perguntei a Platão.

«Sem dúvida, Joana, sem dúvida. O Diógenes agita a multidão e faz-nos pensar, à maneira dele», respondeu o discípulo de Sócrates.

Aquela conversa com Platão fez-me pensar. Confesso-vos que aprecio muito os diálogos que tenho com ele, pela vida que neles existe. Mesmo quando leio um dos seus textos, sinto-me como se estivesse verdadeiramente  conversa com ele – é por isso que tenhos os seus livros cheios de rabiscos nos cantos das páginas. Deixo-lhe perguntas. Sublinho ideias. Assinalo conceitos. Pego neles e revejo-os à luz daquilo que penso e sinto.  Analiso e para isso uso a minha razão, o meu sentir, as minhas convicções. Às vezes sou “obrigada” a mudar de ideias. Mas sou uma sortuda; afinal, moro numa aldeia onde, a cada esquina, encontro alguém com quem posso dialogar. E isso abre-me os horizontes. E começo a suspeitar que esta atitude, de diálogo, é verdadeiramente contagiante. Acabo por levá-la comigo para todo o lado e há dias, quando dei por mim, estava na timeline do twitter a dialogar com o Jerónimo sobre a existência, a consciência e o sonho. Nesse dia lamentei que o Descartes não tivesse conta no twitter, pois seria interessante vê-lo a introduzir a hipótese do Génio Maligno na discussão. Desafiei o Jerónimo:  «e se eu te prescrevesse um livro?» E ele aceitou o desafio de ler algumas páginas do Discurso do Método, diariamente. Havemos de voltar à conversa,  ao diálogo.

Quando andava na faculdade tinha um sonho: abrir um consultório de filosofia e prescrever filósofos aos meus pacientes: para dilemas éticos, ler Kant 3x ao dia, por exemplo. O sonho é que comanda a vida, não é?

E agora, com a vossa licença, vou ali à rua [de baixo]  beber um gin tónico com o Marx e o Engels. Sim, gin tónico, a bebida da moda. É por isso que o meu amigo António  lhes chama de “meninos da Esquerda Gourmet”. Isso eu não discuto, limito-me a comprar a tónica e a levar limões da horta.

 

Texto de Joana Rita Sousa
Ilustração de Ruaz



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