Tipo | “Novas Ocupações”
Aqui há canções bonitas e pessoais.
A primeira coisa que salta à vista na estreia a solo de Salvador Menezes dos You Can’t Win Charlie Brow é que “Novas Ocupações” foi feito sem pressas. Sem pressões. Levou o tempo que era preciso. O seu tempo. Foi devidamente ponderado. Fica a sensação de que nada foi deixado ao acaso. Se o último som que escutamos em “Novas Ocupações” é o de uma porta a fechar-se, como que a assinalar o fim do álbum (se bem que um título como «Artigo Indefinido» dê sempre margem para a porta ficar entreaberta ou encostada), o primeiro é como se nos abrisse essa mesma porta.
A parentalidade é um tema recorrente, umas vezes mais óbvio do que outras. Mas está sempre presente ou não seja algo que nos muda para sempre (eu bem sei) e abraçá-lo é magnífico.
«Confesso» é cantar de coração aberto. É Salvador Menezes a dizer aquilo que aspira ser, sem se esquecer do que é e de quem o fez. Musicalmente falando, entenda-se.
«Desfecho» é uma magnífica canção pop, repleta de pormenores onde Salvador vai atrás dos seus sonhos, numa luta com aquele terrível sentimento interior que nos impede de avançar e arriscar: “vou voltar a procurar e não é a olhar que encontro o sonho de que me fez o conto / que se for assim nunca saio”. Em «Jugoslávia» vamos de viagem por um país que é uma memória – do Reino à República Federal – por vezes conturbada.
«Género Desconhecido» conduz-nos a «Novos Ofícios» e isso não é de todo inocente. Há uma delicadeza que se constrói em volta de um sample do coração da filha de Salvador. É uma canção sobre ser mãe, a aventura e as novas (e imensas!) responsabilidades que isso acarreta. Será, por ventura, a mais bela canção de um disco feito de canções bonitas, com uma aura etérea que a distingue das restantes e sempre com aquele precioso batimento em pano de fundo.
Em «Querela de Vizinhas» o sol tem os dias contados e há que aproveitar a corda da roupa. O pior é quando o espaço falta. Nós encostamo-nos e vamos batendo o pé enquanto assistimos à evolução da “cena”.
O «Fim do Dia» só trás fatalidades e «Autocomiseração de um Desempregado» adopta um tom também ele quase fatalista, fruto da batida meio soturna salpicada por uns teclados desconcertantes q.b. que marcam a canção, mas a mensagem encerra em sim compaixão “sei que não estás enganado / não te sintas tão culpado”. Fecha-se com, «Artigo Indefinido» que nos transporta naqueles sons circulares tão comuns (e bons) dos blues africanos.
Depois ouvimos a porta.
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