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Vodafone Paredes de Coura 2023 | Dia 2 (17.08.2023)

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Texto por Álvaro Graça e fotografia por Rui de Freitas.

O arranque de quinta-feira do Vodafone Paredes de Coura 2023 era especialmente auspicioso, apresentando um par de compositor brilhantes (cada um na sua corrente), que ainda para mais compartilham a língua portuguesa como forma de expressão.

A Garota Não subiu ao Palco Yorn dedica a rentabilizar os quarenta cinco minutos que lhe cabiam no habitual lufa-lufa deste género de certames. Uma mulher de palavras que desta feita quase se cingiu às canções que, no entanto, contêm toda uma riqueza que a artista sadina utiliza para transmitir as suas mensagens tão prementes. Perita em colocar o dedo na ferida e a mão no coração, logra na companhia de Sérgio Mendes e Diogo Sousa conferir uma alma imensa a nível sónico também, tornando os seus concertos numa experiência arrebatadora e emocionante.

No palco-mor, Tim Bernardes apareceu sozinho para nos brindar com um verdadeiro showcase. Foi quase uma sessão intimista, pese embora o vasto anfiteatro natural onde a acção se desenrolou, não tendo faltado mesmo uma parte de discos pedidos. Entre versões de terceiros, lembranças d’O Terno, Tim deliciou a cada instante, com o jeito tão natural e simples com que aparenta fazê-lo, como se não estivesse a cantar e a tocar de modo extraordinário.

Também no Palco Vodafone, ao cair da escuridão, apreciámos o caldeirão do rock de The Brian Jonestown Massacre, que coze invariavelmente em lume brando, mas envolvendo sempre uma intensidade contida que nos mantém reféns. Gerem a actuação com o seu ritmo natural, com as constantes trocas de guitarras em grande parte dos temas, zelando para que estejam reunidas todas as condições para que a sua sonoridade soe o mais perfeita possível. Os desabafos do líder Anton Newcombe assim o explicaram perto do final.

A Sudan Archives coube o palco secundário, onde evoluíram as suas ambiências mutantes, sensuais e intensas, comprovando a sua faceta de animal de palco. A sua atitude torna certamente mais fácil captar a atenção de quem desconhece a sua arte, recolhendo maior tempo de antena, para o que o estranho se entranhe.

Seguiu-se no anfiteatro principal o desejado regresso dos The Walkmen. E que regresso assinaram! Uma performance praticamente imaculada, própria de quem nunca deixou de andar na estrada, e em regime de best of, o que faz sentido quando uma banda fez um hiato. Pelo meio, Hamilton Leithauser foi aproveitando várias músicas para relatar e recordar bocadinhos dos livros de memórias dos The Walkmen, desde as primeiras composições em conjuntos até às diversas cidades por onde foram assentando arraiais. E, por falar em Hamilton, seria terrivelmente injusto não assinalar a estupenda exibição vocal que protagonizou no Vodafone Paredes de Coura, mostrando inclusivamente vários pontos acima do seu nível habitual.

Voltámos ao Palco Yorn para mais uma dose de música bem sensual, desta vez pela mão de Desire e a sua electrónica nocturna. Uma coisa bastante acertada, que envolve a plateia numa rede dançável e pegajosa (no bom sentido, graças às melodias que constituem o menu desta dupla), e simultamente bem característica dos nomes extraídos da editora Italians Do It Better. Simples e eficaz.

À meia-noite entrava em cena, no Palco Vodafone, Loyle Carner, que responsável por outra das melhores actuações da trigésima edição do festival de Paredes de Coura. Foi intenso, interessante e bem emotivo. Quer se queira, quer não, o hip-hop ganha toda outra dimensão quando os rappers são acompanhados por uma banda em palco. Melhor ainda quando os músicos são sensacionais. Com foco nos seus trabalhos «hugo» e «Not Waving, but Drowning», Loyle Carner demonstrou perfeitamente porque é claramente um dos nomes mais refrescantes dos últimos anos da música nascida no confuso Reino Unido.

Seguia-se Fever Ray no mesmo palco, num daqueles acontecimentos que nos leva a recordar do quão único é o Vodafone Paredes de Coura, onde é (felizmente) permitido que bandas de menor porte possam ter o papel de cabeça de cartaz (embora nunca se extingam as vozes que pedem nomes grandes). O mundo gizado pela mente de Karin Dreijer Andersson ganha cada vez mais corpo e alcance, algo que os seus concertos multifacetados ajudarão a alimentar. Há todo um cuidado cénico, há coreografias e representação, que aprofundam o imaginário donde brota o mundo de Fever Ray. E é um óptimo indicador quando uma performance é capaz de prender a nossa atenção duma ponta à outra, e é talvez o melhor elogio que podemos fazer à passagem deste projecto sueco por terras minhotas.

Leiam aqui a reportagem do primeiro, terceiro e quarto dia de festival.



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